“Alegra-te, feliz Lusitânia! Salta de júbilo, Pádua ditosa! Pois gerastes para a Terra e para o Céu um varão que bem pode comparar-se com um astro rutilante, já que brilha, não só pela santidade de vida e a gloriosa fama de milagres, mas também pelo esplendor que por toda a parte derrama a sua celestial doutrina.” Este foi o esplêndido elogio do Papa Pio XII a Santo António.
Doutor da Igreja, Martelo dos Hereges, Doutor Evangélico, Arca do Testamento, Santo de todo o mundo – são alguns dos títulos com que os Soberanos Pontífices honraram aquele cuja vida foi, no dizer de um dos seus biógrafos, um milagre contínuo.
Natural de Lisboa, onde nasceu não se sabe bem se em 1191 ou 1195, filho de Martinho de Bulhões e Teresa Taveira, ambos nobres, o futuro santo recebeu no baptismo o nome de Fernando. De boa índole, inclinado à piedade e às coisas santas, a sua formação espiritual e intelectual foi confiada por seu pai — que era oficial no exército de D. Afonso — aos cónegos da Catedral de Lisboa.
Aos 19 anos, ingressou no mosteiro de São Vicente de Fora, dos Clérigos Regulares de Santo Agostinho, nos arredores da capital.
Ali permaneceu por dois anos, findos os quais, a fim de evitar o contacto assíduo com parentes e amigos, pediu aos superiores que o transferissem para o mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, casa-mãe do Ordem, onde foi ordenado sacerdote em 1220.
Em certo dia desse ano, quando dois franciscanos foram ao seu mosteiro pedir esmola, Frei Fernando perguntou-lhes se porventura seria enviado para a terra dos mouros para sofrer o martírio caso viesse a ingressar na Ordem deles. Diante da resposta afirmativa, no dia seguinte, após obter a duras penas autorização do seu superior, mudou-se para o ermitério franciscano da mesma cidade, onde se tornou filho de São Francisco de Assis. Aí, substituiu o seu nome pelo de António, que o imortalizaria.
Conforme combinado, no final desse mesmo ano, Frei António foi enviado para África. Não estava, porém, nos planos da Providência que ilustrasse a Igreja como mártir, mas com as suas pregações e a sua santa vida. Assim, chegando ao continente africano, foi atacado por uma terrível doença, que o reteve muito tempo no leito. Os superiores decidiram então levá-lo de volta a Portugal, para que se restabelecesse.
Mas, como não era tampouco na sua terra natal que a Providência o queria, o navio que o transportava foi levado por uma tempestade até as costas da Itália, vindo o santo a encontrar abrigo em Messina, na Sicília. Aí, soube que São Francisco havia convocado para Maio de 1221 um capítulo em Assis, onde poderia finalmente encontrar-se com o Pai e Fundador dos Franciscanos, e contemplar a sua angélica virtude.
O Provincial da România, conhecendo-o naquela grande assembleia, resolveu levá-lo consigo. Aí chegado, Frei António obteve dele licença para residir no ermitério do Monte Paulo, a fim de se entregar ao isolamento e à contemplação.
Como Deus Nosso Senhor velava sobre ele, chegou o tempo de a sua luz brilhar para o bem do mundo inteiro.
Frei António foi então enviado a Forli, juntamente com alguns franciscanos e dominicanos que deveriam receber as ordens sacras. O padre guardião do convento em que se hospedaram pediu que algum deles dissesse algo para a glória de Deus e edificação dos demais. Um a um, todos se foram escusando, por não estarem preparados. Restava António. Sem muita convicção e à falta dos demais, o superior mandou-o falar.
Era a primeira vez que António falava em público. Viu-se então a maravilha: da sua boca saíram palavras de fogo, demonstrando um profundo conhecimento teológico e das Escrituras, tudo exposto com uma lógica, clareza e concisão que conquistou a todos.
Entusiasmado, o Guardião comunicou o acontecido ao Provincial, que por sua vez o transmitiu a São Francisco. São Francisco mandou então que Frei António estudasse teologia escolástica, para se dedicar à pregação. Pouco depois, em vista dos seus progressos, ordenou-lhe que trabalhasse para a salvação das almas. Era o ano de 1222 e Frei António contava apenas 30 ou 31 anos.
As multidões acorriam, e até os comerciantes fechavam as lojas para irem ouvi-lo; a cidade e as redondeza paravam literalmente. Sendo pequenas as igrejas para tanta gente – às vezes chegavam a juntar-se 30.000 pessoas num só sermão –, ele falava nas praças públicas. Quando terminava, era necessário que alguns homens valentes e robustos o levantassem e protegessem das pessoas que vinham beijar-lhe a mão e tocar-lhe o hábito.
Um dos milagres mais conhecidos de Santo António é a sua pregação aos peixes. Em Rimini, como as pessoas permaneciam indiferentes ao seu sermão, abandonou-as e foi pregar junto ao mar. Milhares de peixes de todos os tipos e tamanhos puseram então a cabeça fora da água para ouvir o santo, milagre que foi testemunhado por toda a cidade.
Santo António foi cognominado Martelo dos Hereges porque dificilmente a heresia teve inimigo mais formidável. A sua mais antiga biografia, conhecida como Assídua, relata: “Dia e noite tinha discussões com os hereges; expunha-lhes com grande clareza o dogma católico; refutava vitoriosamente os preceitos deles, revelando em tudo ciência admirável e força suave de persuasão que penetrava na alma dos seus contrários.”
António foi devoto de Nossa Senhora desde a mais tenra infância, tendo sido socorrido por ela diversas vezes. Por exemplo, um dia em que, não podendo mais suportar o bem que ele fazia, o demónio o agarrou tão violentamente pelo pescoço que ia enforcá-lo, bastou António balbuciar as palavras da antífona “O gloriosa domina” para que o maligno fugisse apavorado. Recomposto, o santo viu a seu lado a Rainha do Céu resplandecente de glória.
No ano de 1231, sentindo o agravamento da hidropisia maligna que o acometia há algum tempo, Frei António deu-se conta de que a sua hora soara. Quis então morrer em Pádua, a sua cidade de adopção, cujo povo, ao saber que ele estava a chegar, acorreu em tal quantidade, que, para o livrarem do assédio, os frades que o acompanhavam o levaram para casa do capelão das freiras clarissas, onde faleceu, com apenas 40 anos.
Os milagres operados pelo santo no seu túmulo foram tantos e tais, que o Papa Gregório IX o canonizou apenas um ano após a sua morte.